Em cada época cria-se a instituição do amor, à medida que se desenvolve ele muda sua concepção e visão de mundo. Ao mudar essas visões, consequentemente, mudam todas as concepções criadas pelo homem. O amor em cada época apresenta-se com características, formas e matizes que correspondem às mudanças sofridas pelas instituições “Homem”.
Na literatura o amor tem várias faces, e é demonstrado e vivido de muitas maneiras, algumas vezes o amor é idealizado, outras imortal, ora alguém sofre por amor, ora alguém morre por amor.
Retomando alguns clássicos da literatura podemos observar que há no amor uma espera, uma conquista, uma esperança, uma busca constante na literatura e na vida real, por isso em algumas leituras nós leitores nos identificamos, uma vez que falar sobre o amor mexe com nossas sensibilidades.
Há na literatura várias histórias de amor que marcam algum período da história e esse amor era relatado conforme a moral e os costumes da época. Podemos citar como exemplo o amor no “arcadismo” o amor é tranquilo, galanteador, ideal de felicidade como em “Marilia de Dirceu”. Enquanto no mito “Tristão e Isolda” grandes amantes vivem um amor incontrolável, ambos vivendo constantemente em uma explosão de desejo utilizando todas alegorias para viver esse amor. Por outro lado, “O Inferno” de Dante o amor por Beatriz transcende a sexualidade. Já em “Romeu e Julieta” de Willian Shakespeare, segundo Haroldo Bloodn, O mito Tristão e Isolda e Romeu e Julieta são os únicos na literatura que realmente morrem por amor, o consumido e contemplando de todas as formas. Por sua vez “Don Juan”, maior conquistador da literatura, faz do amor um jogo de sedução. Por fim, "Don Quixote" com toda sua loucura inventa um amor, dá vida e acredita que realmente ele existe, mas enfim o que é o amor se não a própria criação que fazemos do outro?
No entanto, não importa como o amor se apresenta nem a época, a única coisa que sabemos é que o amor é universal. Escrever sobre o amor é enfrentar submersão emotiva do próprio eu.
O romance “Tristão e Isolda” nos da a oportunidade de conhecermos os romances medievais do amor impossível. Este é marcado pela morte carnal que é sinônimo de entrada para uma outra dimensão, a qual o amor e a morte estão ligados. Desta maneira o amor cortês medieval tem como núcleo distintivo o livre dom de si, de dizer o sentimento e de articular, com gestos e palavras, a entrega do corpo ao prazer.
Porém, algumas questões sobre o romance “Tristão e Isolda” nos instiga, sabemos que as duas personagens vivem uma história de amor, marcada pela dor,sofrimentos e muitos obstáculos, mas quando morrem e os corpos são sepultados juntos, nasce um espinheiro verde, e frondoso, de galhos fortes de flores perfumadas do lado do túmulo de Tristão e vai de encontro com o túmulo de Isolda, como se a planta representasse a união do casal após a morte, como se todo sofrimento em vida fosse recompensado e eles sendo assim felizes para sempre.
No entanto, por que lamenta Tristão no Inferno de Dante na “Divina Comedia”? Por que o casal está separado?
O Inferno na “Divina Comedia” é o próprio inferno “homem”. Tendo em vista que o romance de “Tristão e Isolda” é do séculoXII ,época que a vida estava presa às tenazes das superstições e do pavor religioso. A igreja neste momento, tem um grande poder sobre as pessoas ela julga, condena e o inferno é a casa ou a última morada, de quem não prática suas leis religiosas.
A igreja condena o amor cortês que é assunto desenvolvido e vivido pelos amantes “Tristão e Isolda”, o amor cortês é visto pela igreja como pecado, inquietação e reprovação.
A exemplos disso, São Jerônimo diz que um homem que ama demais sua esposa , essa é adúltera, pois está transgredindo as regras do bom casamento para se entregar ao prazer deste amor. E é neste contexto que Charles VII ( Rei da Inglaterra ) é julgado por amar demais sua esposa indo contra os princípios da igreja.
Segundo Denis de Rougemont, ao autor do livro “ O amor e o ocidente”, afirma que o romance ocidental deriva do mito “Tristão e Isolda”, onde a associação de amor e morte dá origem etimológica da paixão e sofrimento, e que na maioria dos casos esse amor- paixão se apresenta sob forma de adultério, e sem adultério não haveria literatura ocidental.
Tendo em vista este comentário podemos acreditar que o Inferno de Dante seja uma ironia contra os princípios da igreja, e a obra “Divina Comédia”, mais precisamente “O Inferno” nos faz refletir porque Tristão e Isolda que se amaram perdidamente, enfrentaram a tudo e a todos e mesmo assim não ficaram juntos após a morte.
Sendo assim acredito que Dante quis dar forma a essas dimensões, até então ocultas, da vida sentimental. Dante desafia o que foi clivado e separado pela tradição cristão e pelo neo-platonismo. Podemos ainda dizer que o “Inferno” é uma forma de preparar a igreja para uma nova transformação, desmascarar que a “graça”na teologia cristão seja um mistério ocultando as manifestações da ordem universal assegurada pelo amor sublime totalmente isento de qualquer elemento de desejo físico ou sexual e para completar ainda podemos citar Santo Agostinho que descreve a misteriosa vinda da “graça”, evocando como termo de comparação negativa os prazeres, a sedução, a luxuria do corpo. Lembrando que Tristão está no ciclo da luxúria no “Inferno” da “Divina Comédia”.
Até este momento o homem vive a sombra de si mesmo e de seus sentimentos e Dante representa o milagre desta apresentação viva e concreta do conceito liberdade espiritual, criando uma nova forma de liberdade de expressão para agir, pensar, amar e fazer literatura.
Dante dá vida a essas personagens, no círculo da luxúria onde são julgados por terem amado demais ou por terem cometido adultério, na tentativa de libertá-los dos julgamentos da sociedade, fazendo-a ver os prazeres da carne como algo divino e não pecaminoso. Tais figuras são criadas pelo autor para as transformações que a sociedade vai desencadear, preparando o homem para conceber o amor como realidade, oscilando entre a ternura e o desejo físico, entre a necessidade fisiológica e a dedicação. Entretanto,o romance “Tristão e Isolda” é o retrato, o grito sufocado de um amor que não se realiza devido a moral e os costumes da época, mas sendo esse a porta de entrada para sociedade contemporânea enxergar o amor de modo divino.
Referências Bibliograficas
ALIGHERI, Dante. A divina comédia: inferno. São Paulo: editora 34,1999.
PAZ, Octávio. A dupla chama: amor e erotismo. São Paulo: Siciliano, 1994
PLATÃO. O banquete.2ed. Rio de Janeiro:Difel,2003
ROSENFIELD, katharina. A história e o conceito na literatura medieval: problemas de estética. São Paulo:Brasiliense,1986.
ROSENFIELD, katharina. De Tristão e Isolda a Divina Comédia: Um novo imaginário amoroso, In Revista Signo, Santa Cruz, V.20. 1995.
ROUGEMONT, Denis de. O amor e o ocidente. Rio de Janeiro: Guanabara,1988.