Introdução
Genericamente, entenderemos por transformação afim na reta, aquela definida pela equação x' = ax + b, onde a ¹ 0.
Entre as transformações geométricas usuais identificamos a translação, a simetria e a homotetia, assuntos que serão desenvolvidos aqui neste texto. Para o entendimento deste assunto, entretanto, é fundamental revisar o conceito de vetor, o que faremos agora, não obstante ser um assunto por demais visto nos cursos regulares de Física.
Nota: consta que o termo AFIM, foi introduzido por Leonhard Euler, (grande matemático suíço - 1707/1783), o primeiro a estudar tópicos avançados da Geometria Afim, no século XVIII.
2. Vetor
Considere o segmento orientado AB na figura abaixo.
Observe que o segmento orientado AB é caracterizado por tres aspectos bastante definidos:
- comprimento (denominado módulo)
- direção
- sentido (de A para B)
Chama-se vetor ao conjunto infinito de todos os segmentos orientados equipolentes a AB, ou seja, o conjunto infinito de todos os segmentos orientados que possuem o mesmo comprimento, a mesma direção e o mesmo sentido de AB.
Assim, a ideia de vetor nos levaria a uma representação do tipo:
Na prática, para representar um vetor, tomamos apenas um dos infinitos segmentos orientados que o compõe. Guarde esta ideia, pois ela é importante!
Sendo u um vetor genérico, o representaremos pelo símbolo:
3. Translação na Reta
Seja r uma reta e u um vetor em r .
Observe que o comprimento do vetor u é igual a 5 = 7 -2, mas a sua medida algébrica é igual - 5 , já que o seu sentido é contrário ao sentido positivo da reta.
Sendo P um ponto da reta de abcissa x, uma translação de vetor u na reta, levaria a um ponto P' de abcissa x' dado por x'= x + u, onde u é a medida algébrica do vetor u.
Observe que a translação é uma transformação afim do tipo definido no item 1 acima, onde a = 1 e b = u.
Exemplos:
a) Qual o transformado do ponto de abcissa 3 por uma translação de vetor 5?
Resposta: x' = 3+5 = 8. Portanto, o ponto na reta de abcissa 8 é o transformado do ponto de abcissa 3, pela translação de vetor 5.
b) Qual o transformado do ponto de abcissa 2 por uma translação de vetor -10?
Resposta: x' = 2 - 10 = -8.
c) Considere agora o segmento AB onde xA = 3 e xB = 7. Qual o transformado do segmento AB por uma translação de vetor 2?
Teríamos: x'A = 3+2 = 5 e x'B = 7+2 = 9. Portanto, o transformado do segmento AB de abcissas 3 e 2 é o novo segmento A'B' de abcissas 5 e 9. Observe que o comprimento do segmento AB
(7 - 3 = 4) continuou inalterado no seu transformado A'B' cujo comprimento é igual a 9 - 5 = 4. A distancia entre os pontos A e B pois, foi conservada pela translação. Dizemos então que a TRANSLAÇÃO é uma transformação ISOMÉTRICA, ou seja, é uma transformação que conserva as distancias.
3.1.Composição de translações
Sejam T1 e T2, duas translações de vetores u e v respectivamente:
Temos: T1 = x + u e T2 = x + v
A composição das translações T1 e T2 ( T1 o T2 ) resultaria:
T1o T2 (x) = T1(T2(x)) = T1(x+v) = (x+v) + u = x + (u+v).
Concluímos pois que a composição de duas translações resulta numa nova translação, cujo vetor translação é a soma dos vetores translação de cada uma delas.
Podemos concluir facilmente o que segue:
a) a composição de translações, é uma nova translação, ou seja o conjunto das translações goza da propriedade de FECHAMENTO para a operação "o" - chamada 'composição'.
b) a composição de translações goza da propriedade associativa, ou seja:
T1o(T2 o T3) = (T1 o T2)o T3
c) Se considerarmos uma translação de vetor nulo, ou seja a translação que
leva um ponto em si mesmo, teremos x' = x + 0 = 0 + x = x, ou seja, sendo To esta translação de vetor nulo, podemos concluir que To To = T e, portanto, a composição de translações goza da propriedade da existência do ELEMENTO NEUTRO.
d) É também fácil demonstrar que a composição de translações goza da propriedade comutativa ou seja T1oT2 = T2 o T1.
e) Para toda translação de vetor u podemos considerar outra translação de
vetor -u, tal que a composição delas seja igual a uma translação de vetor nulo.
Seja T1 = x+u e T2 = x - u.
É óbvio que T1 o T2 = T2 o T1 = x = x+0 (translação de vetor nulo).
Dizemos então que a composição de translações goza da propriedade da existência do ELEMENTO SIMÉTRICO (ou ELEMENTO INVERSO).
Portanto, como o conjunto das translações na reta goza das propriedades ASSOCIATIVA, FECHAMENTO, ELEMENTO NEUTRO e EXISTÊNCIA DO INVERSO (propriedades b, a, c e e respectivamente), dizemos que o conjunto das translações na reta tem estrutura de GRUPO em relação à operação 'composição' ("o").
Como além das propriedades acima, ainda é válida a operação comutativa (item d acima ) dizemos que o GRUPO é COMUTATIVO ou ABELIANO.
Observação: Abeliano em homenagem a Abel (Niels Henrik Abel, matemático norueguês que nasceu em 05/08/1802 e faleceu em 06/04/1829, vitimado pela tuberculose, aos 27 anos!).
O conceito de translação que é um dos tipos de transformação afim na reta. Veremos a seguir, os conceitos de SIMETRIA CENTRAL e de HOMOTETIA na reta, sendo aconselhável entretanto que você faça uma revisão da Parte I já publicada neste site, para efeito de fixação de conceitos.
4. Simetria central na reta
Seja C um ponto fixo de uma reta r. A transformação geométrica que a cada ponto de PÎ r associa um outro ponto P' Î r tal que
P' - A = A - P , é uma simetria de centro C. Sendo x' a abcissa de P', c a abcissa do centro de simetria C e x a abcissa do ponto P, conforme figura abaixo, poderemos escrever:
P' - C = C - P ou em termos de suas abcissas: x' - c = c - x , donde concluímos a fórmula fundamental da simetria central na reta:
x' = 2c - x
Por exemplo, se P é um ponto de abcissa x = 10, então o transformado de P por uma simetria de centro no ponto C de abcissa c = 4 será o ponto P' de abcissa x' dada por x'=2.4 - 10 = -2, ou seja -2 é o transformado do ponto 10 pela simetria de centro 4.
Como vimos na parte I, as transformações afins na reta são descritas de uma forma genérica por uma equação do 1º grau da forma x'= ax+b. Comparando com a equação da simetria (x' = 2c - x), concluímos que neste caso, como também podemos escrever x'= -x + 2c, teremos então a = -1 e b = 2c.
NOTA: Na fórmula da simetria, sendo c = 0, obteremos x' = - x, ou seja, - x é o simétrico de x em relação à origem (abscissa nula).
4.1. Composição de duas simetrias centrais
Sejam as simetrias S1 e S2 definidas respectivamente pelas suas equações genéricas x' = S1(x) = 2c1 - x e x' = S2 (x)= 2c2 - x.
Vamos determinar a simetria composta S1 o S2.
Teremos:
S1 o S2 (x) = S1[S2(x)] = S1[2c2 - x] = 2c1 - (2c2 - x) = x + 2(c1 - c2)
Observe que x+2(c1-c2) é do tipo x + u onde u = 2(c1- c2), que é a fórmula da translação e portanto, concluímos que a composição de duas simetrias resulta numa translação.
Já analisamos a translação e a simetria central na reta. Agora é a vez da HOMOTETIA, uma transformação afim na reta de grande importância. Antes, entretanto, vamos falar de ponto fixo ou ponto invariante de uma transformação geométrica.
Já sabemos que as transformações geométricas na reta são definidas de uma forma genérica por uma equação do 1º grau do tipo
x' = ax + b, com a ¹ 0, onde x' é a abcissa do transformado do ponto de abcissa x.
Diz-se que x é um PONTO FIXO (ou PONTO INVARIANTE) de uma transformação geométrica na reta, se o transformado do ponto x é o próprio ponto x, ou seja, x' = x.
Nestas condições, sendo x' = ax + b, fazendo x' = x, vem:
x = ax + b \ x - ax = b \ x(1 - a) = b \ x = b / (1 - a), para a ¹ 1.
Exemplo:
Seja a transformação T definida por x' = 3x + 18. Qual o ponto fixo dessa transformação?
Ora, fazendo x' = x , vem: x = 3x + 18 de onde conclui-se que x = - 9.
Realmente, se determinarmos T(-9) obteremos:
T(-9) = 3(-9) + 18 = -9, ou seja: o transformado do ponto de abcissa -9 pela transformação T é o próprio ponto.
5. Homotetia na Reta
O termo homotetia segundo o Novo Dicionário Brasileiro de Melhoramentos, 7ª edição, é também conhecido como homotesia e definido como "relação entre duas séries de pontos, tal que os de cada uma estão dois a dois em linha reta com um centro comum e separados destes por distancias de razão constante".
Complicado, não é? Vamos simplificar as coisas, usando a linguagem matemática? Vamos lá!
Consideremos uma reta r e um ponto P Î r. Seja C Î r um ponto denominado centro da homotetia. Consideremos ainda um número real k ¹ 0, denominado razão da homotetia. Entenderemos como HOMOTETIA, a transformação geométrica H que transforma o ponto P num ponto P' da reta r tal que:
P' - C = k (P - C)
Sendo x', c e x as abcissas dos pontos P' , C e P respectivamente, podemos então escrever:
x' - c = k(x - c) \ x' = kx - kc + c = kx + c(1 - k).
Portanto, x'= kx + c(1 - k) é a equação geral de uma homotetia na reta, de centro c e razão k .
Vamos analisar a equação da homotetia:
a) centro na origem: c = 0
Substituindo na equação acima c = 0 vem: x' = kx e temos nesse caso uma homotetia dita LINEAR.
b) razão da homotetia igual a 1 (k = 1)
Neste caso, teremos x' = x e temos nesse caso que a homotetia é uma transformação INVARIANTE ou seja, todo ponto é transformado em si mesmo.
c) razão da homotetia igual a (-1) (k = - 1)
Substituindo na equação geral da homotetia, teremos x'= (-1).x + c[1 - (-1)]
Logo, nesse caso, x' = 2c - x , que como sabemos da aula anterior, trata-se da fórmula da simetria.
Então, as homotetias de razão igual a (- 1), são simetrias.
Podemos então generalizar que as simetrias são simplesmente homotetias de razão igual a menos um.
Exemplos:
1 - Qual o transformado do ponto de abcissa 5 por uma homotetia de centro 10 e razão 2?
Solução:
Teremos: x'= kx + c(1 - k) = 2.5 + 10(1 - 2) = 0.
Resp: a homotetia transforma o ponto de abcissa 5 no ponto de abcissa 0.
2 - Qual o centro e a razão da homotetia definida por x' = 10x - 30?
Solução:
Vamos comparar a equação dada, com a equação geral das homotetias. Temos: x' = kx + (1 - k)c = 10x - 30
Para que a igualdade acima seja verdadeira, deveremos ter: k = 10 e (1 - k)c = - 30
Substituindo o valor de k=10, vem: -9c = - 30 e portanto c =(-30)/(-9) = 10/3.
Resposta: razão 10 e centro 10/3.
3 - Qual o ponto invariante (ou ponto fixo) de uma homotetia definida pela sua equação geral x' = kx + (1 - k)c ?
Solução:
Como já sabemos, deveremos ter x'=x. Logo, x = kx + (1 - k)c
x - kx = (1 - k)c \ x(1 - k) = (1 - k)c.
Temos então:
1º caso: k = 1 Þ a igualdade é verdadeira para todo valor de x e isto significa que todo ponto é invariante.
2º caso: k ¹ 1 Þ x = c e, neste caso, concluímos que só existe um ponto fixo ou invariante que é o centro da homotetia.
Nota: Dada a homotetia x' = mx + n, podemos concluir que a razão da homotetia é igual a m (k = m). Considerando-se que o centro c da homotetia é um ponto fixo (ou invariante), para determinar o centro da homotetia, basta fazer x = c.
Exemplo:
Qual a razão e o centro da homotetia definida pela equação x' = 5x - 40?
Solução:
a) a razão da homotetia é igual a 5
b) para determinar o centro, basta fazer x' = x. Logo, x = 5x - 40 \ x = 10.
Portanto, a expressão dada é uma homotetia de razão k = 5 e centro no ponto da reta, de abscissa c = 10.